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Acerca do Alentejo...

O Alentejo foi a minha primeira paragem vínica, não obstante ter nascido, ser criado e actualmente continuar a residir numa grande região produtora de vinhos.

Para um palato não treinado, a doçura dos campos intermináveis, aquele calor que os vinhos não conseguem esconder, foi um autêntico "canto de sereia". Os anos passam, o palato e o gosto tem alguma evolução e o Alentejo já não é o El Dorado...

Não nego que vinhos alentejanos são coisas algo raras na minha garrafeira, agora que consigo compreender o úbiquo Castelão ou a natural conjugação de factores que fazem os vinhos do Dão e da Bairrada tão mais interessantes.

Mas como em tudo existem excepções. As grandes casas, Esporão por exemplo, têm vinhos que ainda me agradam muito, sendo talvez o Private Selection branco o meu favorito da vastíssima gama de tintos e brancos que brotam daquela casa de Reguengos.

Foi por isso, á procura de algo novo vindo das planicies e montes alentejanos, que fui pela primeira vez ao Vinhos do Alentejo em Lisboa, no CCB.

75 produtores á prova. Muitos vinhos para analisar. Livra...

Primeiras notas. O alcóol. Muitos produtores não têm ou não conseguem ter ou pura e simplesmente estão a "lixar-se" para o controlo do alcóol. Foi recorrente estarem á prova vinhos de 14,5 e 15 % de volume alcóolico. Alguns destes valores que me espantaram foram inclusive em vinhos brancos! Bem sei que nas planicies é dificil controlar as maturações e que apenas os vinhos que são feitos perto de Portalegre ou perto da Serra de Ossa, conseguem atingir aquela frescura e mineralidade e alcóol controlado que procuro agora em outras paragens do país vínico, mas não há razões para não haver uma maior preocupação com o volume de alcóol. Neste momento em que as adegas estão apetrechadas da mais alta tecnologia e cheia de artefactos e ciências que metem um vinho a cheirar a coisas que não têm nada de estar ali ou a saber a baunilhas e frutas exóticas sem nunca terem passado pela madeira, não há desculpa para tão altos valores de alcóol. Tive mais do que uma vez respostas tão rídiculas como "no Alentejo espera-se um vinho assim, forte!" ou "o alcóol é apenas mais uma expressão do terroir".

Apesar de tudo, passo a enumerar alguns bons brancos que fiquei com eles na memória:


Herdade da Fonte Coberta reserva 2011.
Bom vinho, com as castas habituais (Arinto e Antão Vaz) faz boa prova, mas é um vinho que tem o tal contra: 14% de volume alcoólico. Se não for servido á temperatura correcta, é muito fácil estragá-lo. Podem saber mais aqui

 
Herdade Grande Alvarinho e Verdelho 2012
Surpreendido por estas migrações contra-natura (nessas coisas sou um purista, desculpem... há coisas que não deviam de sair dos sitios de origem... o Alvarinho é uma delas...) fui levado a provar. Bom vinho, sabor levemente citrino, mas agradável. 


Adega Cooperativa da Vidigueira - Ato 3 ( a Saudade )
Não tenho foto para esta, peço desculpa, mas é um estupendo vinho! Antão Vaz, Perrum e Arinto, formam grande simbiose naquele que foi o meu branco favorito da tarde/noite

Ervideira Sociedade Agrícola - Vinha D´ Ervideira Espumante Bruto

 Gosto imenso de espumantes e este não foge á regra. Muito boa conjugação de castas, Perrum e Antão Vaz fazem um espumante de caracter forte e sedoso na boca. Grande amplitude de utilização, este é daqueles que vai com tudo, embora o representante da marca tenha "insistido" numa utilização mais vocacionada, para uma entrada. 



Terras de Alter - Telhas Branco 2012 
O senhor Peter Bright, Australiano globetrotter que veio cá parar, nos idos anos 80, anda há anos a fazer bons vinhos por esse país fora. Mas acho que é no alentejo que se dá melhor. Dentro da enorme gama que esta casa proporciona este é considerado o melhor, o grande branco da casa. Não engana, é mesmo bom. 100% Viognier, outra casta importada de França que aparenta dar-se bem com o Alentejo. Senti-lhe bom potencial de envelhecimento.


Nos tintos, a coisa no Alentejo, tem tendência a perder-se. São muitos, mesmo mesmo muitos. Provei mais de 20, a maior parte deles em doses muito generosas. Assim sendo e porque para o final as minhas notas tornaram-se cada vez mais incoerentes, vou por aqui alguns e não todos os que provei.


Destaco:

Susana Esteban Procura 2011 e Aventura 2012
Desta senhora já provei bons vinhos, especialmento os do Douro (Quinta do Crasto e Quinta do Cotto), mas a crítica faz sempre grande alarido do excepcional trabalho que esta genial enóloga faz no Alentejo.

Este Procura de 2011, é um vinho diferente. Resultado de uma busca incessante pelo vasto território alentejano, entre vigor e elegância, foi encontrar em duas vinhas distintas. Uma, de Alicante Bouschet em Évora e uma vinha muita velha na zona de Portalegre. Vigor e elegância, misturados por uma enóloga espanhola no Alentejo...

O vinho é superior. O resultado final, tem tudo para entrar no clube restrito dos mitos alentejanos.

O Aventura é um vinho muito correcto, com grande aptidão gastronómica.


Dona Maria - Julio B. Bastos 2007
Li muito acerca dos Garrafeiras da Quinta do Carmo, dos anos 80. Vinhos que desafiaram os entendidos e segundo consta, ajudaram a mandar abaixo o mito, que os vinhos alentejanos não envelheciam bem. Sei de quem bebeu recentemente os Garrafeiras de 87 e 88 e parece que estão para durar.
 
A história deste vinho em particular é sobejamente conhecida, não vou aqui repeti-la. Não sei ao que sabem esses miticos vinhos da Quinta do Carmo, mas este é impressionante. Muito concentrado, quase xarope, mas uma elegância, um volume de boca ... um teste aos sentidos...



Herdade do Mouchão 2007
O Mouchão nunca falha, não perdoa e nunca engana. Consistentemente, ano após ano, continua a desafiar o mundo vínico.

Nunca me esquecerei das palavras da reputadíssima Jancis Robinson "Quem dera a muitos produtores da Borgonha, saberem fazer um Mouchão!"

Master of Wine dixit...


Paulo Laureano Vinus - Selectio Tinta Grossa 2010
Eu sou suspeito em relação a este produtor. Não escondo que gosto da atitude, da filosofia subjacente á empresa e das pessoas envolvidas. Gosto desta teimosia, de só usar o que é nosso e mostrar o que de melhor se pode fazer com elas.

Este é um mono varietal de Tinta Grossa, uma casta muito rara e quase esquecida, que dá muito trabalho em manter. Talvez por isso mesmo seja rara e esquecida.

Este para mim, apesar de ainda existir um Vinea Julieta Talhão 24, é o melhor vinho deste produtor.

Enorme vinho. Agora está espectacular, daqui por uns 10 anos, é uma coisa do outro mundo...



Este evento serviu para sentir o pulso ao dinamismo da nossa maior região produtora. Existem muitos projectos novos, boas mentalidades e empreendorismo. Resta esperar que tudo corra bem.

ps- numa nota muito pessoal, muito obrigado aos representantes do Ervideira e das simpatiquissímas senhoras que representavam os vinhos do Paulo Laureano. As generosas ofertas estão muito bem guardadas.


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